Distribuição de lucros em escritório de advocacia
O sonho de cada jovem acadêmico de Direito é ter seu próprio escritório de advocacia, possivelmente em sociedade com um ou mais colegas de áreas complementares no negócio jurídico e, juntos, conquistarem o sucesso profissional e financeiro. Como em qualquer área profissional, aliás. Esse jovem vai descobrir só mais tarde um dos dilemas da sociedade em escritórios de advocacia: como calcular a distribuição dos lucros.
Tarefa fácil, pode ser imaginada de início pelos jovens e sonhadores acadêmicos. Afinal, são todos amigos e trabalhar em conjunto engrandece a alma e facilita a realização do sonho de fama e sucesso.
Não há fórmula exata sobre este tema
Pode ser e tomara que estas almas mantenham esta grandeza de espírito. Mas, a chegada da realidade, mais tarde, vai desnudar alguns mistérios que rondavam escondidos por trás do sonho de sucesso. As tarefas diárias do causídico têm revelado, na prática, que uma sociedade de advogados, em especial com vários sócios, encontra sérias dificuldades na hora de calcular os lucros e distribuí-los entre os que, com justiça, demandam uma parte desse bolo.
E isso por pelo menos duas peças chaves importantes que precisam ser levadas em consideração: 1) Qual a fórmula exata para calcular o percentual de ganho de cada sócio; 2) É preciso considerar algumas questões legais, como o pro labore e o desconto do INSS dos sócios, além do recolhimento do Imposto de Renda devido.
Autores têm dificuldades com definições
Este assunto é tão áspero que existem vários autores dedicados a estudá-lo, mas, sem consenso. Aliás, alguns destes autores já escreveram verdadeiros compêndios sobre o tema e ele continua a dividir opiniões.
Para começar a conversa, a grande incógnita é exatamente sobre como definir a participação societária de cada sócio em percentuais que separem exatamente o merecimento de cada um. É que uma Sociedade Unipessoal de Advocacia, na definição legal, tem seu principal patrimônio encravado na cabeça de cada sócio. São os anos de trabalho, o acúmulo de conhecimento e o traquejo no trato forense que dão ao advogado o seu maior patrimônio.
Valor patrimonial é o conhecimento
Pois trata-se de um patrimônio que não é físico. Certamente, nenhum sócio do empreendimento considera como sua grandeza patrimonial os móveis, mesas, cadeiras, estandes e computadores que compõem a estrutura física de seu escritório. Estes são, com absoluta certeza, de valor insignificante diante dos conhecimentos acumulados por cada um dos sócios.
Todos os dias, ao fechar o escritório, os móveis ficam e o patrimônio caminha com cada um para suas casas. É possível até mesmo que a sociedade empresarial composta pelos sócios, registrada na Junta Comercial e OAB, contenha uma divisão percentual sobre o que seria a participação de cada um na montagem do negócio.
Discordâncias iniciam-se com os lucros
Entretanto, o fechamento das contas no balancete mensal ou na apuração de resultados no final do ano fiscal, certamente irão revelar discordâncias na distribuição dos resultados. Por isso, ao ser esta a definição mais difícil, vamos começar pela questão fiscal, onde tem que haver o acerto com o leão do IR.
Certamente a empresa terá um escritório de contabilidade a lhe prestar esses serviços contábeis. E sabe-se que o advogado tem experiência nesse tipo de assunto. Mesmo assim, vamos lá: é muito importante que sejam feitos pagamentos a título de pro labore e que sejam claros, em termos legais, a separação dos pagamentos de pro labore e de distribuição de resultados.
Definir bem o que é pro labore
É que têm havido algumas interpretações da Receita Federal que consideram todos os pagamentos da pessoa jurídica (sociedade no escritório) aos advogados como rendimentos ou remuneração pelo trabalho. E aí cada advogado pode ser obrigado a pagar os 27,5% de IR, considerando-se a tabela de rendimentos pelo trabalho.
E todos nós sabemos que recebimentos como resultados ou lucros são isentos do IR. Então, o aconselhável é fixar uma parte – possivelmente igual para todos – como pagamento de remuneração pelo trabalho. Digamos, um ou dois salários mínimos. Depois, no final de cada mês, pagar a cada um dos sócios sua parte como resultado nos rendimentos, conforme tabela de participação elaborada pela sociedade.
A situação legal precisa ser clara
É importante também que, junto com o escritório de contabilidade, haja a definição de como será o pagamento ao INSS de cada um. Pode haver um complemento como autônomo, por exemplo, conforme as preferências de cada um dos sócios. O importante é deixar isso muito claro, para não ter que acertar contas depois com o leão do IR, porque estas são sempre doloridas ao bolso. Feito isso, seu IR será mais tranquilo e menos pesado.
Pois bem, definida esta questão legal – importante demais, lembre-se -, vamos àquela primeira, mais complicada: como definir o valor patrimonial de cada um na sociedade, se este patrimônio não é tangível.
Quando os números frios falam mais alto
Alguns matemáticos até arriscam fórmulas, tão complicadas que são mesmo difíceis de entender. Recorrer a algumas delas pode ser a solução, em caso de discordâncias intransponíveis. Mas, o bom mesmo é encontrar-se o consenso entre os membros da sociedade.
O que vai exigir perfeita afinidade entre os sócios, pois sempre pode haver um que se julgue prejudicado quando começarem a aparecer os números, sempre frios e alheios aos sentimentos de cada um. Indagações do tipo: se todos são sócios, participam do trabalho da manhã à noite, esforçam-se em busca de clientes e trabalham juntos na administração das equipes, porquê uns devem ganhar mais do que os outros?
Fatores para levar em consideração
Lembre-se: o ideal é a afinidade de pensamento entre os sócios e a definição por consenso sobre o percentual que cada um vai receber a cada mês. Ou no final do ano, na divisão de resultados do empreendimento. Mas, isso não é sempre fácil, pois existem alguns fatores que precisarão ser levados em consideração.
Vamos a alguns deles:
- Na carteira de clientes ativos, a conquista deles foi igualitária entre os sócios?
- O número de horas trabalhadas com esses clientes é também igual para cada um dos sócios? Lembre-se que determinado cliente pode preferir trabalhar com este e não com aquele advogado! Sabemos que isso é comum.
- E a performance de cada um dos sócios no trabalho com esses clientes, a sequência de êxitos vai ou não ser levada em consideração? Afinal, é isso que define a entrada de lucros para a sociedade, não é mesmo?
- A conquista de novos clientes – em valores – como vai ser computada? Ou fica assim: entrou para a carteira de clientes, vira divisão comum?
Quem se sobressai mais, ganha mais?
Como pode ser visto, são muitas as definições a serem tomadas pelos sócios ao acertarem a distribuição dos lucros em um escritório de advocacia. A necessidade de entendimento e consenso é o mais indicado, mas, sempre difícil de ser encontrada.
Existem ainda muitas outras questões que precisam ser levadas em consideração. Por exemplo: a personalidade de cada sócio. Existem alguns que se sobressaem mais, adoram escrever, dar palestras, participar de associações e entidades de interesse da classe ou sociais, como CDL, sindicatos ou associações comerciais.
Uma linha tênue de definições
O normal nestes casos é que estes apareçam mais e, portanto, sejam os maiores captores de novos clientes. Sejam responsáveis pela maior entrada de recursos para a sociedade, em detrimento daquele sócio, altamente competente e cumpridor de tarefas, mas que, por personalidade, prefere as ações internas, dentro do escritório, acompanhando processos e dando prosseguimento com méritos a cada um deles.
Ou seja, a definição sobre a forma de pagamento sobre resultados a cada um destes sócios precisa ser clara, mas os valores não são tangíveis. E quem define valores intangíveis? E tem também a administração do escritório. Cada vez mais com funcionamento igual a qualquer outra empresa, inclusive com necessidade de gestão financeira e captação de novos clientes via ativa programação de marketing, o escritório passa a exigir maior dedicação de um dos sócios nestas tarefas. Como é possível verificar, a linha de definições, numa sociedade não patrimonial, é tênue e de difícil mensuração. O que vai exigir alta capacidade de discernimento para cada um dos sócios.